Entenda a crítica social por trás de Meu Amigo Pedro, de Raul Seixas


Louco para uns e genial para outros, Raul Seixas sempre soube pensar fora da caixa. Em suas letras, o "maluco beleza" fugia da caretice e criticava constantemente quem vivia para se encaixar em padrões. Além de Maluco Beleza e Metamorfose Ambulante, Meu Amigo Pedro também tem essa pegada de crítica social. Ao contrário do que muita gente pensa devido ao trecho "Pedro onde cê vai eu também vou", a letra não tem como foco principal uma amizade inseparável. A canção foi escrita em parceria com Paulo Coelho. De acordo com o Whiplash, os compositores se inspiraram no irmão careta de Raul Seixas e no pai de Paulo Coelho. Para que tudo isso fique mais fácil de entender, no post de hoje irei dissecar essa letra.

Vamos por partes, trecho por trecho, começando pelo começo: 

Muitas vezes, Pedro, você fala / Sempre a se queixar da solidão / Quem te fez com ferro, fez com fogo, Pedro / É pena que você não sabe não

O "fazer com ferro" se refere a algo seguro e o "fazer com fogo" se refere a algo que queima e arde. O Pedro a quem Raul Seixas se refere acredita que escolheu a forma mais segura de viver: "trabalhando enquanto eles dormem" e garantindo seu ganha pão. Porém, ele não se sente feliz com essa vida, mas sim, isolado. Msmo assim, acredita ter feito a escolha certa.

Vai pro seu trabalho todo dia / Sem saber se é bom ou se é ruim / Quando quer chorar vai ao banheiro /  Pedro, as coisas não são bem assim

Pedro está acostumado a viver no piloto automático, fingindo que está tudo ótimo e chorando escondido no banheiro para não ser visto em seu momento de fragilidade. Porém, no fundo ele sabe que não está totalmente satisfeito com sua rotina.

Toda vez que eu sinto o paraíso / Ou me queimo torto no inferno / Eu penso em você, meu pobre amigo / Que só usa sempre o mesmo terno

Raul prefere apenas viver. Às vezes ele se sente no paraíso e às vezes no inferno, ou seja, passa por altos e baixos, comete erros e acertos, como qualquer um. Porém, Pedro vive sempre a mesma rotina, ou seja, "veste sempre o mesmo terno", a sua "roupa de viver", como diz o poema de de Clarice Lispector. 

Pedro, onde você vai eu também vou (2x) / Mas tudo acaba onde começou

Essa é a parte em que as pessoas confundem com a descrição de uma amizade inseparável. Levando em consideração o contexto da letra completa, o mais provável é que, com "para onde você vai eu também vou", Seixas quis dizer que, independente das escolhas que você fizer na sua vida, você vai morrer de qualquer forma. Rico ou pobre, todos têm o mesmo destino. 

E com "tudo acaba onde começou" interpreta-se que: nascemos pelados, carecas e banguelas. Sem nada, sem posses. No final da nossa vida, a situação não é muito diferente: não levamos nada. 

Tente me ensinar das tuas coisas / Que a vida é séria e a guerra é dura / Mas se não puder, cale essa boca, Pedro / E deixa eu viver minha loucura 

Traduzindo: "tenta explicar por que é tão importante seguir um padrão de vida, Pedro. Do que você está se protegendo? Ah, você não sabe? Então cala a boca e deixa eu ser feliz. Eu estou bem assim"

Lembro, Pedro, aqueles velhos dias / Quando os dois pensavam sobre o mundo / Hoje eu te chamo de careta, Pedro / E você me chama vagabundo

Houve uma época em que "Pedro" e Raul eram próximos e refletiam juntos sobre a vida. Entretanto, com o tempo, cada um seguiu caminhos diferentes. Na descrição da letra, Raul prefere ser "maluco beleza" e viver sem regras. Enquanto isso, Pedro prefere viver uma vida mais regrada. Essas diferenças dividiram os dois, fazendo com que ambos se rotulassem de careta e de vagabundo.

Todos os caminhos são iguais / O que leva à glória ou à perdição / Há tantos caminhos, tantas portas /  Mas somente um tem coração

Novamente a música diz que, independente do caminho que você siga na vida, todos eles são iguais e levam ao mesmo destino final. E qual seria o único caminho que tem coração? Minha teoria para essa frase é que ela se refere às escolhas que realmente façam a pessoa feliz.

E eu não tenho nada a te dizer / Mas não me critique como eu sou / Cada um de nós é um universo, Pedro / Onde você vai eu também vou

Neste trecho, entende-se que Raul aceita que "não tem nada a lhe dizer", ou seja, nenhuma grande lição para ensinar. Mesmo assim, isso não significa que Pedro deve rotulá-lo ou cag*ar regra. Cada pessoa na vida é única e, de novo: no final, vamos todos para o mesmo lugar.

Confira a música abaixo:


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4 comentários

  1. Ooi amanda; muito bom o texto, e a análise da letra. Raul era um crânio! A maioria das músicas sérias dele, pode notar, traz uma mensagem, uma crítica, uma reflexão... É como em "mamãe eu não queria", "Cowboy fora da lei" ou "você" (que tem uma letra bem profunda, se pensarmos bem). Mas minha música preferida do Raulzito é "Quando você crescer". Não é uma música famosa; não ficou conhecida, nem teve tanta repercussão. Mas é foda! Vou deixá-la no link aqui em baixo, ouça lá e diga o que acha.

    E quase que me esqueço. Tem também "baby", uma composição onde Raul fala de feminismo, sabe qual é, né? Enfim, a maioria das músicas do cara são interessantes.

    E olha o linkzinho: http://www.youtube.com/watch?v=6AbEIGF0rAI

    Vou nessa, tchau...

    Obs: eu sempre pensei que "dissecando" fosse escrito com "C", mas agora fui ver no dicionário, e é com "SS" mesmo...

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  2. Muito bom este post, filosofar no busão também faço de vez enquando. Raul Seixas possuia uma genialidade que poucos compreendem, mas você se saiu bem, meus parabéns.

    Arthur Claro
    http://www.arthur-claro.blogspot.com

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  3. Muito legal sua interpretação, também comecei a escutar Raul no carro do meu pai, e também "viajava" nas letras, imaginando coisas completamente diferentes, que a essa musica, vi no filme do Raul o irmão dele dizendo que ela foi feita para ele, por ele ser "careta" e levar uma vida normal...

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